segunda-feira, 23 de março de 2015


REALIDADE E ILUSÕES SOBRE A EDUCAÇÃO LIBERTADORA E OS FUTUROS ENFRENTAMENTOS DOS EDUCADORES COM O ESTADO

Teones França – Historiador  (17/12/2014)

 


(Parte II/II)

 

O que para os trabalhadores e seus representantes deveria ser uma educação pública de qualidade? Repetimos isso como um mantra há anos, mas sabemos de fato o que queremos ao erguer essa bandeira? Será que a lógica marxista de combinar instrução, ginástica e trabalho produtivo está presente aí? Talvez o debate de anos travado na Escola Politécnica (conceito esboçado inicialmente por Marx) da Fiocruz a respeito dessas questões possa ajudar bastante.

                No entanto, parece-me que essa e outras discussões a respeito da educação são por nós geralmente desprezadas. E, assim, não realizamos o debate e nos abstemos de disputar a consciência dos educadores sobre essas questões. A impressão que fica é que o único ponto de pauta presente em nossas assembleias é a deflagração ou não da greve. Pouco importa debater com o conjunto dos educadores a implantação de uma educação para os filhos dos trabalhadores. Com isso, apenas as propostas governistas adentram os portões das escolas públicas e temos que nos virar para questioná-las.

Quanto à educação na rede pública estadual, ao que se reduziu? Com seus currículos mínimos, objetivando padronizar por baixo os conteúdos para facilitar a melhoria dos resultados nas provas do governo federal e, consequentemente, o crescimento do índice do estado no Ideb; com suas políticas de meritocracia, meras “cenouras” postas à frente dos educadores para que corram com mais afinco despejando no dia a dia as estratégias medíocres do secretário de educação de plantão; com seus números reduzidos de funcionários, obrigando os mestres a se desdobrarem em diversas funções e transformando as escolas em reles depósitos de crianças que, supostamente, estudam enquanto seus pais vão ao trabalho.

O que faremos diante dessa realidade? O de sempre? Ou seja, greve para tentar recuperar nossas perdas salariais e questionar os projetos mirabolantes postos em prática em todo início de governo? Sem contar que nem apresentamos em contrapartida um projeto alternativo.

Acho que a greve segue sendo a principal tática de luta e resistência dos trabalhadores, mas é necessário secundarizá-la em alguns momentos, como este, para não desgastá-la. As greves de pouca adesão dos últimos anos (na rede estadual-RJ) e os parcos resultados obtidos afastaram ainda mais os educadores, temerosos com o corte de ponto e outras arbitrariedades. É salutar que analisemos bem a conjuntura do momento e paremos com a dicotomia greve ou peleguismo. Utilizar em dados momentos (como o próximo ano) outras formas de luta pode se mostrar mais adequado. Lembremos que no auge da luta sindical no Brasil nos anos 1980 novas formas de luta (greve cera, greve da vaca doida etc.) foram criadas com o objetivo de tornar a luta mais eficiente.

O boicote ao currículo mínimo deve voltar à baila. Não podemos aceitar a perda de nossa autonomia em decidir quais conteúdos devem ser ministrados. Consequentemente, debater em cada escola a necessidade de virarmos as costas para as tais provas governamentais que não servem para nada além de elevar o índice do estado no Ideb. É necessário dar mais ênfase à crítica à meritocracia, conceito que é bem aceito no conjunto da sociedade.

No mesmo sentido, uma campanha pelo não lançamento de notas no sistema on line também deve ser implementada. Se o governo se recusa a realizar concurso para funcionários, se não há secretários nas escolas a culpa não é nossa. Por que aceitarmos “adiantar aula” quando falta um colega? Por que não denunciarmos com mais competência as (várias) turmas nas escolas que passam o ano inteiro sem professores de diversas disciplinas?

Devemos também propor a recusa em aprovar aluno que não tenha rendimento suficiente. Chega de “empurrar” aluno para outra série porque o governo quer diminuir o índice de evasão e repetência. Ao final do ano, com um índice de reprovação condizente com o real poderemos divulgar que “essa é a verdadeira realidade da educação no estado”.

É verdade que essas propostas – e outras de orientação parecida – não são novas, mas a sua ênfase em momento tão frágil quanto o atual pode ser o possível a ser feito e, se bem feito, representar um passo importante na destruição por dentro da política governamental.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário