quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Nos 30 anos de vida da CUT por onde andam seus ex-presidentes e o ímpeto inicial da central?

                                                  Teones França , historiador e professor da rede estadual do RJ 

         Fundada em agosto de 1983, como uma culminância das lutas sindicais iniciadas pelos metalúrgicos do ABC paulista em fins dos anos 1970, a Central Única dos Trabalhadores escreveu uma importante página na história do movimento sindical brasileiro, especialmente na década de oitenta, quando protagonizou diversas mobilizações contra o Estado ditatorial, já em seu momento derradeiro, e contra os ataques burgueses aos trabalhadores, ataques que não cessaram com o fim do regime militar.

 Foi justamente naquela década que surgiu – apesar de ter ficado por lá mesmo – o que talvez tenha sido a sua maior contribuição: ser um ponto de referência para os trabalhadores do Brasil, indicando-lhes que muitos inimigos da sua classe social compunham a unidade contra os militares e que, portanto, o fim desse regime significara apenas o começo das jornadas de luta que ainda estavam por vir. Infelizmente, esse caráter classista da central se perdeu ao longo dos anos noventa.

   Apenas seis homens ocuparam até o momento o cargo de presidente da CUT em seus 30 anos de vida. Muitos não sabem, mas a principal expressão do nosso sindicalismo, Luis Inácio Lula da Silva, que tem sua trajetória de militância se confundindo com a da própria CUT, nunca presidiu a central, apesar de em dados momentos ter agido como sua eminência parda.
Lula, sentado ao chão, come entre os participantes do Congresso que fundou a CUT

Componentes da primeira Executiva Nacional da CUT. Entre eles : Jair Meneguelli, 
Paulo Paim (atual senador /PT) e Delúbio Soares (um dos mensaleiros).
Meneguelli, à esquerda, discursa no Congresso de fundação da central.

Vejamos quem são os seis.
 Jair Meneguelli – Metalúrgico do ABC, primeiro presidente da CUT, central da qual esteve à frente entre 1983 e 1994, tendo sido reeleito em duas ocasiões. Atualmente é presidente do Conselho Nacional do Serviço Social da Indústria (Sesi).

Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho – Metalúrgico do ABC. Presidiu a CUT entre 1994 e 2000, tendo sido reeleito uma vez. Hoje é deputado Federal pelo PT.

João Antonio Felício – Professor, foi presidente dessa central entre 2000 e 2003. Atualmente é Secretário de Relações Internacionais da CUT. Tenta tornar-se presidente da Central Sindical Internacional (CSI) em 2014.

Luis Marinho – Metalúrgico do ABC, presidiu a CUT entre 2003 e 2006. Foi Ministro do Trabalho por um período no governo Lula e atualmente é prefeito de São Bernardo do Campo pelo PT.

Arthur Henrique da Silva Santos – eletricitário e sociólogo, foi presidente dessa central entre 2006 e 2012, tendo sido reeleito uma vez. Atualmente coordena o Instituto de Cooperação Internacional da CUT.

Vagner Freitas – bancário. Atual presidente da CUT, eleito em 2012.

   Temos, assim, que uma vez eleito para ocupar o cargo de dirigente máximo dessa central em nível nacional, sua carreira pública torna-se infinita.

   Desses 30 anos da CUT os últimos dez foram marcados pelo aprofundamento de sua relação simbiótica com o PT em função da chegada desse partido à presidência da República. Para muitos a partir de então a central tornou-se chapa branca. Vagner Freitas não enxerga dessa forma, apesar de concordar que a relação cutista com o governo federal mudou após o governo Lula. Segundo ele, isso se deu porque "Lula é fruto da luta da CUT", e tornou-se "o maior exemplo do sindicalismo cutista". Sendo assim, a central não poderia tratar o seu governo, como também o de Dilma, "da mesma forma que o Meneguelli tratou os militares, o Sarney e o Collor, nem como o Vicentinho tratou com FHC". Para Freitas o que explica essa mudança é que "os tempos são outros".

   Entretanto, fica difícil percebermos tanta diferença entre Dilma e FHC quando observamos o leilão da Bacia de Libra realizado pelo governo federal esta semana. Os tempos até podem ser outros mas a sensação de déjà vu torna-se iminente quando agora lembramos do ano de 1995 e do ataque feroz de Fernando Henrique à greve dos petroleiros que tinha como uma de suas bandeiras a defesa do monopólio estatal do petróleo, que chegava ao fim justamente naquele momento.

   Por outro lado, foi fácil percebermos a ausência de faixas e cartazes cutistas, assim como de seus principais dirigentes, nas recentes manifestações contra o leilão de Libra. Se em 1995 a central foi uma das principais articuladoras da luta para que o petróleo brasileiro se mantivesse longe das garras das petrolíferas estrangeiras, em 2013 os poucos discursos de seus dirigentes contra a continuação da entrega das riquezas do subsolo brasileiro foram mera retórica.

sábado, 12 de outubro de 2013

Diretor de escola estadual no RJ: mero agente do governo. Se não é eleito, não me representa!

por Teones França,
 historiador e professor da rede estadual do RJ

         Há pouco mais de quinze anos, quando me tornei docente da Rede Estadual de Educação RJ, ainda pude acompanhar uma época em que se elegiam os diretores das escolas e estes eram representantes legítimos de suas comunidades. Foi uma época que teve início com o período de redemocratização pelo qual passava o país após o fim da ditadura militar, mas que, infelizmente, durou muito pouco.
         A partir da gestão de Anthony Garotinho esses ares mais democráticos foram sendo soprados para bem longe do estado e as eleições para diretores foram suspensas. Esse processo tem se alastrado rapidamente para outras regiões do país. Em Niterói, por exemplo, a chefia das escolas recém-inauguradas pela prefeitura é entregue a indicados do Executivo. Matéria publicada na última semana pelo jornal Folha de São Paulo mostrou que um em cada cinco diretores de escolas públicas no Brasil é posto no cargo por indicação de políticos.
         A recente greve dos profissionais de ensino da rede estadual no Rio de Janeiro - que tem dentre sua pauta de reivindicação a exigência de eleições diretas para a direção dos estabelecimentos escolares - reacende a necessidade desse debate. A sociedade, assim como as próprias escolas, precisam priorizar esse debate, mesmo porque uma das funções primordiais do gestor de escola pública é definir a melhor alocação de verbas, que, em última instância, pertencem ao conjunto da população.
         Antes de analisarmos as atitudes arbitrárias tomadas por governo e diretores no decorrer dessa greve, cabe fazer algumas perguntas para aqueles que vivenciam o cotidiano de uma escola pública, tenha ela diretor eleito pela comunidade ou não: existe, de fato, uma gestão democrática no seu ambiente escolar? O uso que é feito da verba pública no estabelecimento é decidido de maneira conjunta ou apenas pelo diretor? O Projeto Político Pedagógico implementado - se é que há - pela escola é amplamente discutido pelos seus profissionais? Existe autonomia para os docentes ministrarem suas aulas da maneira que considerarem mais adequada ou são orientados (autoritariamente) a seguir currículos pré-estabelecidos pelo governo? Os estudantes são incentivados a se organizarem autonomamente? 
         Acredito que um número ínfimo das escolas públicas em nosso país podem responder positivamente a maioria das perguntas acima. Certamente, esse quantitativo diminuirá bastante se considerarmos apenas a rede estadual do Rio de Janeiro. Sendo assim, creio que já passou da hora de debatermos o real papel de um diretor de escola da rede pública de ensino, dado que a maioria se perpetua no cargo e transforma as escolas em verdadeiros clubes de amigos onde a norma seguida geralmente é: aos amigos, tudo, aos inimigos, a lei.
         Numa luta coletiva, como é a greve, onde projetos de educação distintos se põem a nu, conseguimos separar nitidamente o joio do trigo dentro de uma escola. A que foi deflagrada pelos professores e funcionários do estado no dia 8 de agosto fez surgir certas peculiaridades que merecem ser trazidas à tona para que tenhamos mais elementos disponíveis ao realizarmos esse debate.
         Desde o início do movimento os diretores recebem as ordens do governo por e-mail!!! E respondem, diariamente - e como cordeiros -, a perguntas do tipo: quantos profissionais estão em greve, quais são os seus nomes etc. Assim, não se furtam a entregar ao inimigo (não deles), numa bandeja, a cabeça daqueles que seriam seus colegas de trabalho.
Uma das últimas ordens, ainda mais absurda, não foi dada de modo virtual, mas numa reunião entre representantes governistas e diretores na qual estes foram orientados a pôr no Mapa de Controle de Frequência o código de falta aos que aderem à greve e exercem, assim, um direito que lhes seria concedido pela atual Constituição. A consequência direta de tal atitude será a exoneração por abandono de emprego quando se atingir dez faltas consecutivas. Aos que não estão informados sobre os detalhes dessa categoria, o código de greve foi conquistado por esses trabalhadores numa greve, ainda no primeiro governo Brizola, justamente para evitar qualquer problema desse tipo no exercício da greve.
         Ao que tudo indica, os diretores estão cumprindo à risca tal determinação e para isso, mais uma vez, utilizam-se do falso argumento de que caso não a cumpram serão eles os exonerados. Ademais, não teriam culpa alguma nessa atitude já que apenas cumprem ordens de seus superiores.
Cabe lembrar que muitos nazistas ao final da 2a guerra tentaram ser absolvidos dos seus crimes justificando-os exatamente com esse argumento: apenas cumpriam ordens. Em atitude parecida, os que dirigem as escolas estaduais atualmente - desconheço exceções - acatam cegamente as ordens (que nem chegam às escolas por escrito e assinadas!!!!!), descendo sobre as costas dos profissionais o chicote que lhes é dado pelo Sr. Cabral, submetidos que estão à lógica do faremos tudo que o mestre mandar.
         Como explicar atitudes como estas contra supostos colegas de trabalho? Se ficássemos apenas na superfície, poderíamos acreditar que trata-se do medo de serem exonerados e perderem os trinta dinheiro que ganham de gratificação. Mas, é mais profundo que isso. O cerne da questão é que as direções de escolas, especialmente as da rede estadual RJ, deixaram há muito de serem representantes das suas comunidades para tornarem-se representantes do governo. São testas de ferro, capatazes que cumprem com determinação as ordens de seus superiores.
         É por isso que diminui em profusão as eleições diretas para a escolha de diretores de escolas, pois estes transformaram-se em cargos de confiança dos governantes. Tenho convicção de que esses dirigentes escolares são hoje pontos de apoio do governo espalhados nas milhares escolas (estaduais ou não) contribuindo de maneira categórica para o desmonte da escola pública, para a implementação das políticas privatizantes e da desqualificação da educação. O retorno às eleições pode amenizar esse quadro já que haverá o comprometimento prévio do eleito com a comunidade escolar.
         Atualmente no estado são escolhidos por méritos (!) dentro da lógica da política meritocrática de Cabral. Cabe então a indagação: se um diretor de escola estadual no RJ é escolhido por seus próprios méritos a partir de um concurso, será que é permitido a alguém que seja questionador das políticas antieducacionais desses governantes tornar-se diretor, mesmo que seja um ótimo educador e gestor comprovado em tal concurso? É óbvio que não. Conclusão: dentro dessa lógica, o principal mérito que um aspirante ao cargo de diretor de escola estadual deve ter é o de ser subserviente ao governo de plantão.
         Diante do exposto, creio que não há mais a menor possibilidade de continuarmos a considerar um diretor de escola como um profissional da educação. Ele deixou de ser um integrante dessa categoria e passou para o outro lado da trincheira exercendo a tarefa de gestor do caos implementado pelos governantes dentro da escola pública. Se assim o é, os que compõe o exército dos trabalhadores em educação devem compreender que além do combate ao inimigo externo à escola terão também que combater o inimigo interno. Portanto, na sua luta em defesa de uma educação pública de qualidade e de melhores condições de trabalho terão que batalhar em duas frentes e, da mesma forma que apontam a artilharia de seu exército para os governos, terão que igualmente apontá-la para o Gabinete do Diretor.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Repúdio à parcialidade da imprensa burguesa na greve da educação RJ! Em defesa das organizações dos trabalhadores!

por Teones França, 
Historiador e professor da rede estadual de educação do RJ.

A greve dos profissionais de educação do Rio de Janeiro tem demonstrado, principalmente através das massivas ações de rua, que as jornadas de junho têm continuidade. Por isso, os veículos da grande imprensa estão voltando suas baterias contra o movimento num claro objetivo de enfraquecê-lo e impedi-lo de obter o apoio da sociedade, tendo em vista que até artistas globais fazem uso das redes sociais para manifestar solidariedade aos profissionais em luta.

O jornal O Globo é um exemplo da cobertura parcial que a imprensa burguesa faz desse movimento. Tal tabloide, que dias atrás conseguiu bastante repercussão ao realizar autocrítica de sua postura conivente junto à ditadura militar no Brasil, segue dando mostras de que não reviu suas práticas e permanece de braços dados com os donos do poder mantendo-se como caixa de ressonância dos projetos que visam a manutenção da ordem do capital.

Entretanto, no dia 3 de outubro último, O Globo não fez nem questão de tentar esconder suas garras afiadas contra as mobilizações dos trabalhadores da educação carioca ao buscar associar a luta (legítima) desses profissionais a radicalismos de partidos de esquerda, PSOL e PSTU, que não aceitaram a razoável proposta apresentada por Paes porque têm como "prioridade enfrentar a aliança partidária no poder no estado e na prefeitura".

Nem o governo foi tão enfático ao defender sua proposta que, de acordo com o editorial do jornal, teve o mérito de melhorar os salários e a progressão na carreira dos professores. No entanto, os editores esqueceram-se de fazer menção à ausência, na proposta de Paes, de qualquer melhoria para os funcionários das escolas, além de também se esquecerem de dar aos grevistas o direito da argumentação em contrário.

Mas, isso não é tudo. Após praticamente considerar os educadores como idiotas, ao afirmar que são "historicamente uma massa de manobra política", o jornal acusa o Sindicatos dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro (SEPE) de servir como "trampolim político para militantes", pois , apesar de "em seu estatuto se declarar independente de partidos políticos, sua diretoria central inclui várias pessoas que já disputaram cargos políticos e que militam em siglas como PSTU".

Mesmo que saibamos que o jornal burguês cumpre apenas o seu papel de defesa dos interesses de sua classe e, portanto, não somos ingênuos a ponto de esperarmos o apoio de tal imprensa à luta dos trabalhadores, é necessário repudiar essas críticas já que elas visam atacar diretamente organizações da classe trabalhadora.

Antes de tudo é importante reconhecer que os movimentos sociais devem ser apartidários, contudo não são, de maneira alguma, apolíticos. Sendo assim é justo que qualquer militante desses movimentos tenha o direito de se filiar ao partido político que lhe convier, da mesma maneira que queira ver seu partido crescer. O que deve ser inadmissível para qualquer sindicalista vinculado ao SEPE (assim como o é para os militantes sérios em todas as áreas dos movimentos sociais) é que o sindicato, enquanto instituição, disponibilize o seu aparato para a construção de determinado partido político. E isso, certamente, não é o que se observa quando analisamos de maneira imparcial a história de mais de três décadas dessa instituição sindical.

No mesmo sentido, é direito de todos que militam nos movimentos sociais e que enxergam a sociedade com as lentes da luta de classes se apresentar como alternativa num processo eleitoral para a sua própria classe social. Se não, vejamos: que lógica há num sindicalista que participa de greves, às vezes por meses a cada ano, lutando contra os ataques dos governos e dos patrões, em épocas de eleições parlamentares fazer campanha e votar nos candidatos ligados aos governos e aos patrões ou que defendam as políticas destes? Qual é o crime cometido pelos sindicalistas que nas eleições para deputado, prefeito etc. se apresentam como alternativa eleitoral para os seus pares, ou seja, os trabalhadores?

Ora, se concordarmos então que um trabalhador tenha o direito a se pôr como opção no jogo eleitoral (burguês, diga-se de passagem) temos que nos perguntar quais são os melhores nomes para cumprir essa tarefa. Não há dúvida de que os melhores candidatos são os mais conhecidos, que podem, por isso, ter mais público para ouvir suas propostas. E dentre estes estão os dirigentes sindicais. Como os candidatos do campo dos trabalhadores já não possuem dinheiro suficiente para competir com as campanhas milionárias patrocinadas pela burguesia, se ainda forem totalmente desconhecidos de seus possíveis eleitores tornam-se anticandidatos em potencial.

Podemos apontar alguns aspectos que estão por trás dessa visão burguesa maniqueísta. Em primeiro lugar, há a intenção mais imediata de enfraquecer a greve dos profissionais da educação, e que já dura, heroicamente, mais de dois meses. Junto a isso está o ataque desferido às organizações dos trabalhadores aproveitando o momento oportuno para desqualificá-las perante à sociedade. E, por fim, de forma indireta, revela-se a ideia preconceituosa de que o trabalhador serve apenas para executar tarefas e não possui virtudes para legislar ou governar, pois para se qualificar a exercer essas tarefas deve-se possuir, no mínimo, curso superior, apresentar-se bem engomadinho, de terno e gravata etc., o que está distante da realidade da maioria dos trabalhadores em nosso país.

Nessa mesma edição de O Globo já citada percebemos que a ira desse órgão de imprensa não se estende a todo sindicalismo, mas apenas àquele que apresente uma feição mais combativa. Assim, lemos que o SEPE perdeu na Justiça o direito de ser a organização representativa dos profissionais da educação do estado do Rio de Janeiro para uma outra instituição sindical que, sem dúvida, deve ser merecedora de elogios por parte desse jornal já que, como bem sabemos, possui uma prática sindical que se limita a ações judiciais e é avessa às ações mais diretas. A greve da educação carioca, com assembleias que chegaram a contar quinze mil pessoas e atividades de rua com a presença de números bem parecidos, responde por si qual é a entidade sindical mais representativa para esses profissionais.

Ironicamente, no bojo dos ataques implementados pelo jornal a esses militantes no dia 3 de outubro é indicado, por ele próprio, a importância de um sindicato como o SEPE para a classe trabalhadora brasileira na atual conjuntura: "o SEPE se radicalizou e, hoje, não está mais sob a influência direta do PT".

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Somos todos professores! Contra a ditadura de Paes e Cabral!

por Teones França, 
historiador e professor da rede estadual do RJ


O PMDB surgiu no início da década de 1980 como extensão do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), sigla esta que agregava os que se opunham ao regime militar pela via legal. Hoje é uma legenda que expressa muito bem o caráter clientelista da maioria dos partidos no Brasil que se mantêm na base do toma-á-dá-cá. Em nível nacional abriga nomes como José Sarney, Renan Calheiros e Michel Temer. No Rio de Janeiro é a sigla dos governantes Eduardo Paes e Sergio Cabral e contam em seus governos com o apoio do PT, partido da presidente, numa relação tão simbiótica que já se especula que o governador ganhará um ministério em Brasília no futuro próximo.

Uma das grandes glórias que o PMDB reivindica para si é a de ter sido um dos principais articuladores na feitura da atual Constituição brasileira, promulgada em 1988 e personificada na figura daquele que até hoje é a maior expressão desse partido: Ulysses Guimarães. Tal Carta está completando 25 anos, o que para muitos intelectuais é a constatação do amadurecimento da democracia em nosso país, pois nela constariam avanços democráticos importantes, como o direito de greve.

Entretanto, nessas duas décadas e meia contabilizamos muitos movimentos grevistas que tiveram suas manifestações surpreendidas por golpes de cassetetes desferidos por policiais sob a falaciosa justificativa da manutenção da ordem (leia-se ordem do capital). É comum também nessas ocasiões, além da violência física, o corte de ponto dos grevistas, muitas das vezes com o beneplácito da Justiça do Trabalho. Na verdade isso corrobora o que já sabemos há muito tempo: muitas das leis contidas na legislação brasileira são meramente letras mortas.

No recente movimento grevista dos professores do Rio de Janeiro temos visto – assim como já havíamos visto nas manifestações de junho passado – mais um ato desse espetáculo arbitrário que em nada deixa a dever aos anos de chumbo da ditadura militar.

Um observador estrangeiro que sentou em frente à sua TV nos últimos dias para assistir ao Jornal Nacional e, na sequência de uma matéria otimista sobre as bodas de prata da Constituição com a nossa sociedade, certamente estarreceu-se com as imagens que apresentavam policiais fardados despejando gás de pimenta nos olhos de professores, como se estivessem borrifando água em simples plantas, e utilizando seus cassetetes tal qual a espancar assassinos cruéis. Inevitavelmente questionou: o que esse povo festeja no vigésimo quinto aniversário de uma Constituição se ela não garante o direito de greve e manifestação aos trabalhadores?

De fato, Cabral e Paes (nome que soa bastante irônico neste momento) desempenham tão bem o papel de carrascos dos movimentos sociais que deixam os Bolsonaros pouco saudosos dos generais de outrora.

Felizmente, professores e funcionários das escolas públicas do Rio de Janeiro, não se curvando a esses carrascos, demonstram que têm a exata noção de que somente a luta muda a vida e estão nos dando uma verdadeira aula, não em salas fechadas, mas nas ruas, nas praças, no peito e na raça.

Àqueles que questionam esse movimento com a argumentação de que ele prejudica os alunos, cabe dizer que essa greve, além de já ter se configurado em um grande ensinamento prático à juventude indicando que no Brasil direitos só são conquistados na marra, ela é fruto da falta de estrutura e descaso do poder público com a educação e seus servidores.

Ela (a greve) é, inclusive, resultado da falta de resignação dos educadores com os prejuízos sofridos pelos alunos diariamente nas escolas ao longo de tantos (des)governos. Prejuízos que foram agravados nas gestões de Paes e Cabral.

É difícil que consideremos como ganho para o alunado ter um professor especializado em um conteúdo lhe ministrando aulas de outras matérias para as quais ele não foi preparado. No estado, isso já acontece há anos com o Projeto Autonomia que transfere dinheiro público para os cofres da Fundação Roberto Marinho (!).
Pouco provável também é que ideias advindas do mundo fabril, como os modelos de gestão baseados na lógica da produtividade, possam funcionar de maneira adequada dentro das escolas.

Contudo, tiranos não costumam fazer autocrítica e creem que o mais fácil é se eximir da culpa apontando o dedo acusatório para outrem. Assim, os governos vêm culpando há tempos os professores pelo fracasso da educação no país. Nesse bojo é que se divulgam as políticas baseadas na meritocracia, defendidas pelos governantes do Rio de Janeiro, já espalhadas pelo país afora e que só recebe elogios da mídia ligada ao capital.

O cerne dessas politicas é perverso: a ideia liberal de que o mais bem preparado deve ganhar mais, sem que antes discutamos as condições prévias desiguais de preparo para cada um.

Acontece que isso é apenas uma nuvem de fumaça já que a maioria da nossa sociedade aceita bem a ideia de que o melhor deve sempre sobressair e uma parte da categoria veja nisso uma chance imediata de melhorar seu nível salarial. Porém, é uma lógica falsa já que é improvável que os educadores de gabinete dos governos consigam aferir de maneira profícua os méritos de cada professor a partir do resultado de poucas avaliações realizadas pelos alunos. Outros tantos fatores (situação socioeconômica, acúmulo prévio de conhecimentos, estrutura escolar etc.) interferem no bom ou mau desempenho nessas avaliações e, portanto, a conduta do professor em sala de aula é apenas mais um elemento.

Na realidade, mérito é algo que professores e funcionários de escolas públicas no Brasil têm de sobra, pois além de serem concursados, enfrentam condições de trabalho precárias e nem por isso se eximem em superar os obstáculos, que são muitos.

Paes e Cabral, por sua vez, é que demonstram não terem mérito algum para ocuparem o cargo em que se encontram. Mau uso da verba pública, utilização do patrimônio público em benefício próprio, favorecimento a compadres são exemplos de conduta pouco ilibada associada a eles pelos próprios veículos de imprensa que hoje os defendem. No meio de um movimento grevista legítimo, entre a persuasão e a força optam sempre pela segunda, assim como fizeram e fazem qualquer ditador comum.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Veja matéria sobre o livro “Sou Memória, sou Cubango: recanto da raça negra – letramento, samba e fé”

Memorial Roberto Silveira recebe lançamento do livro sobre o bairro Cubango
20.09.2013 | 5:47 pm
Professor Teones França com os alunos da Escola Estadual Dr. Memória

O Centro de Memória da História e Literatura Fluminense – Memorial Roberto Silveira recebeu na tarde desta quinta-feira (19) o lançamento do livro “Sou Memória, sou Cubango: recanto da raça negra – letramento, samba e fé” (Editora iVentura), dos escritores Fernanda Santos e Teones França. Financiado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), a obra de 101 páginas é um passeio pela história do bairro do Cubango, Zona Norte de Niterói, destacando seus patrimônios históricos e culturais, como a centenária Capela de Santo Expedito, a tradicional escola de samba Acadêmicos do Cubango, o sincretismo religioso influenciado pela raça negra e a Escola Estadual Dr. Memória, da qual os autores do livro são docentes. E foi justamente através da escola que a ideia do livro surgiu.
”Tudo começou há cinco anos atrás, quando começamos um trabalho para resgatar a história da Escola Estadual Dr. Memória, que ano que vem completa 70 anos. Porém, percebemos que os moradores mais antigos da região tinham mais a falar do bairro em si. Então descobrimos muitas histórias interessantes do local que mereciam ser contadas em um livro. Um dos objetivos do livro é resgatar o orgulho do morador do Cubango”, contou Teones à equipe de comunicação da Fundação Municipal de Educação (FME).
Durante o evento, o escritor ministrou uma palestra aos alunos e professores para falar um pouco mais do livro e do bairro. Outro fator que impulsionou o projeto é o que ele chama de “diminuição do Cubango”.
“Fizemos um estudo e descobrimos que o bairro vem diminuindo ano após ano. Se antes ele começava no Largo do Marrão e ia até a Alameda São Boaventura, no Fonseca hoje ele é constituído basicamente entre dois quarteirões. Isso se deve à especulação imobiliária, pois as grandes empreiteiras não querem associar seus empreendimentos a um lugar cercado por morros. O Cubango só é visto de forma positiva apenas um dia no ano: quando a escola de samba desfila. No restante do ano é um bairro é associado à violência. Nosso objetivo é quebrar essa visão”, concluiu.
Nascido e criado no local, o também escritor Antônio Soares, autor do livro “Às margens plácidas do Rio Calimbá”, que conta histórias de sua infância no bairro, prestigiou o lançamento. Para ele, o livro de Teones e Fernanda é um desdobramento da sua obra.
”É um livro extraordinário, que traz uma riqueza de detalhes e conta facetas do Cubango que eu não abordei”.
         O livro, que não está à venda por ter sido financiado pelo FNDE, será distribuído aos estudantes das escolas municipais da cidade, em uma tiragem inicial de 1000 exemplares. Ao final, Teones França dedicou o livrou às famílias das vítimas do deslizamento no Morro do Bumba, em abril de 2010.
       
Teones destaca a importância da valorização do bairro do Cubango
         
        Texto e Fotos: Magno Navarro