terça-feira, 24 de junho de 2014

A COPA DAS LUTAS!


Apesar da truculência de Alckmin, metroviários/SP indicam a melhor tática para vitórias.

 

Teones França - Historiador - 10/06/14

 


                Diferentemente do ano passado, o outono de 2014 trouxe lutas organizadas de maneira mais tradicional e várias greves são deflagradas pelos sindicatos nas principais cidades do país. Insufladas por uma nova reorganização do sindicalismo – na qual bases de diversas categorias atropelam direções sindicais – essa onda grevista que se espalha pelo Brasil tem, no entanto, o mesmo motivador principal que originou as jornadas de junho em 2013: a Copa do mundo.

                O descontentamento gerado pelo desperdício do dinheiro público destinado à construção de estádios de futebol e obras que facilitarão, prioritariamente, o acesso dos visitantes do aeroporto aos seus hotéis e aos locais de competição tem sido o elemento determinante para trazer a classe trabalhadora de volta à sua tradição de luta organizada como há tanto tempo não se via. Se não há mais dúvida de que haverá Copa, também é inquestionável que esta será conhecida futuramente como a Copa das lutas. Dessa forma, para que ela não seja vencida apenas pelos empreiteiros, pelos grandes conglomerados empresariais e pela Fifa, que lucrarão de maneira absurda com o evento, é fundamental que os trabalhadores busquem a unidade, pois somente assim será possível sagrarem-se vencedores também.

                Pressionados pela Fifa e escaldados após as manifestações ocorridas no ano passado, os governos e a burguesia brasileira souberam se preparar previamente para enfrentarem as lutas que sabiam que despontariam nesse momento. Alteraram leis, aumentaram o efetivo de repressores fardados nas ruas, mantêm-se inflexíveis diante das reivindicações dos trabalhadores e obtiveram o apoio incondicional da Justiça do Trabalho, que finalmente mostra que é um mero sustentáculo dos governos e do grande capital. Demonstrando que estão em plantão diuturno, nossos magistrados estão atentos para logo após a deflagração de uma greve decretá-la abusiva, garantindo a “legalidade” da truculência dos governos e da repressão contra os trabalhadores.

                A recente greve dos metroviários de São Paulo exemplifica isso de maneira muito nítida. A divergência entre a solicitação de reajuste dos grevistas e o índice oferecido pelo governo do estado é ínfima, mas este não pode ceder, pois o caminho da luta se tornaria um modelo a ser seguido por outras categorias, o que precisa ser impedido pelos governantes. Ao contrário, além de toda a repressão na tentativa de conter as manifestações dos metroviários, o governador Alckmin demitiu, no último dia 9, cerca de 45 grevistas por justa causa, utilizando-se de critérios como mínimo questionáveis, mas contando com toda a complacência dos juízes.

 Mais uma vez tivemos a confirmação de que a lei de greve é mais uma das existentes no Brasil apenas para permanecer no papel. Todas, ainda no início, são consideradas abusivas, embora na maioria dos casos governos e patrões não tenham cumprido com o que reza a nossa Constituição, concedendo reajustes salariais anuais. Os ditos “serviços essenciais” então sofrem ainda mais, pois são tantas as exigências existentes na regulamentação dessa lei que, caso as sigam integralmente, os trabalhadores desses setores nunca realizarão uma greve de fato.

Na atual greve, os metroviários paulistas fizeram uma contraproposta ao governo para que a paralisação não prejudicasse a população – crítica primeira feita por Alckmin e todos os governantes que se vêem às voltas com um movimento grevista. Sugeriram retornar ao trabalho, porém com as catracas liberadas para que os usuários viajassem gratuitamente. O governo, claro, recusou a proposta, sob o argumento de que “o Metrô é uma empresa e, como empresa, precisa ter equilíbrio financeiro”. Em outras palavras, o lucro tem primazia sobre o conforto da população trabalhadora, a que necessita realmente do transporte público.

Uma greve, mesmo que se torne vitoriosa, não melhorará significativamente a vida dos trabalhadores, que pouco tempo depois perceberão a necessidade de realizar outro movimento grevista para novamente conquistar melhorias salariais. Contudo, a greve é o momento privilegiado para escancarar as contradições e os limites do sistema capitalista ao expor sem tergiversações os dois campos antagônicos nessa sociedade: de um lado, os trabalhadores e, de outro, os patrões, auxiliados pelos governos e pela justiça. Nesse cenário, caso não lute, o trabalhador não obterá avanços trabalhistas.

Categoria de destaque no bojo do que se tornou conhecido como “novo sindicalismo” na década de 1980, os metroviários já eram inovadores em suas formas de luta naquele momento. Na greve de 1990, no Rio de Janeiro, enfrentando o autoritário governo de Moreira Franco, implementaram o que eles próprios denominaram como “Operação roleta livre”. Num dia inteiro, os grevistas bancaram liberar a passagem de todos que quisessem fazer uso do serviço do Metrô, numa operação que contou com um diretor do sindicato responsável por cada estação, 14 trens circulando e o trabalho integral de todos os funcionários. O objetivo era conquistar o apoio da população, tão difícil de ser obtido em greves do serviço público.

Nesse dia, 250 mil pessoas viajaram de graça, configurando um grande sucesso dessa atividade. De acordo com o presidente do sindicato na ocasião, Geraldo Cândido, na assembleia em que se decidiu a utilização dessa tática foi dito o seguinte para os participantes: “nós vamos assumir a empresa e nós vamos distribuir o produto para a população”, o que em sua opinião seria algo análogo “à apropriação dos meios de produção” pelos trabalhadores.

Ao resgatarem essa tática de luta na atual greve na capital paulista, os metroviários contribuíram duplamente. Por um lado, indicaram que é salutar buscar nas experiências vivenciadas ao longo da história da classe trabalhadora ensinamentos para as lutas contemporâneas e, por outro, expuseram as contradições e hipocrisias do governo burguês de plantão, forçando-o a retirar sua máscara de mantenedor do bem-estar de todos e mostrar sua verdadeira face de garantidor dos interesses do grande capital.

 

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