quinta-feira, 14 de agosto de 2014

DEPOIS DA COPA VEM A DISPUTA PELO VOTO


O que esperar das primeiras eleições após as manifestações contra a corrupção?   (ÚLTIMA PARTE)           
Teones França – Historiador       (28/7/2014)


Nas três partes anteriores deste texto tratei do tema das eleições de 2014 de uma maneira ampla e sem especificar os meus interlocutores. Nesta parte final, além de defender o voto nulo como sendo a política mais acertada para o pleito que ocorrerá em outubro próximo, procurarei dialogar com um público mais específico: os que se consideram socialistas, muitos dos quais são militantes ou simpatizantes de partidos como o PSTU, o PCO, o PCB e de algumas correntes que se agrupam no PSOL.
Já que parto do pressuposto de que vivemos em uma sociedade dividida em classes inconciliáveis entre si e que se digladiam o tempo todo por almejarem interesses distintos, e concordo com os que diante desse cenário consideram a imparcialidade improvável, esta parte preocupa-se em debater essencialmente com os que têm nítida sua opção de classe ao lado dos trabalhadores. 
É possível que todos que se identificam com essa opção concordem com o que pensava Lenin sobre a participação dos representantes dos trabalhadores – no caso, especificamente os “revolucionários” – nas eleições burguesas. De acordo com o líder da revolução russa era uma obrigação dos revolucionários participarem das eleições e do parlamento enquanto as massas mantivessem esperanças nas instituições da burguesia, entretanto, era preciso lutar contra essas ilusões fazendo do parlamento um bastião das lutas proletárias, trazendo à superfície a verdadeira faceta dessas instituições, acelerando, assim, a experiência com elas. Outro ensinamento dos “clássicos” socialistas é que para se evitar o desvio esquerdista – “a doença infantil do comunismo” – é necessário fazer política tendo como referência as massas e não a vanguarda.
Tomando essa lógica como base, participar ou não das eleições é uma mera decisão tática e não um princípio que possa definir se os partidos socialistas são eleitoreiros ou capituladores ao jogo burguês. É a conjuntura que irá definir a tática mais adequada a ser elaborada. Numa eleição ocorrida em plena ditadura, por exemplo, é bem possível que a política mais acertada seja a coligação com os setores burgueses contrários a esse regime. A questão central e definidora é que para os socialistas o objetivo final de sua participação nas eleições não é a eleição de parlamentares.
Nesse sentido, foi absolutamente incompreensível o que ocorreu nas últimas eleições presidenciais, onde os partidos do campo socialista se pulverizaram em várias candidaturas. Resultado: Plinio, do Psol, José Maria, do Pstu, Rui Pimenta, do Pco, e Ivan Pinheiro, do Pcb obtiveram JUNTOS menos de 1% dos votos totais. Perderam feio para nulos e brancos. Não acredito que caso estivessem reunidos numa única candidatura o resultado pudesse ser necessariamente mais positivo, mas certamente as propostas apresentadas teriam uma ressonância maior. Além do mais esse resultado pífio reflete o pensamento predominante no conjunto de nossa sociedade atualmente que, conforme discutimos nas partes anteriores deste texto, tende a cada vez mais questionar as eleições, o parlamento e a atuação dos políticos indistintamente.
A impressão que transparece é que se tratava apenas de uma disputa paralela entre essas siglas, unicamente para apresentar sua legenda e seu programa, mesmo que seu discurso não tivesse eco algum. Ou seja, uma política feita apenas para a vanguarda e sem saldo positivo para os socialistas. E, pior, a população ignorou essa disputa paralela, esses partidos se misturaram junto às legendas burguesas na sopa de letrinhas que é o sistema partidário brasileiro e, consequentemente, foram também achincalhados pela população. No entanto, os principais dirigentes dessas legendas deviam pensar e defender internamente: “é apenas a visão de uma massa iludida, temos pouco com que nos preocupar já que somos bons e o resto é m.”. De todos eles, nitidamente é o Psol o que aparenta a maior avidez pela eleição de parlamentares como meta principal. Se isso não fosse verdadeiro, como explicar a negociação de uma aliança com outros partidos de esquerda em São Paulo e não ter a mesma postura no Rio de Janeiro? Resposta: no Rio existe a candidatura do deputado “Tropa de Elite” que somará (ainda) muitos votos para essa legenda, um quantitativo que não deverá, para esse partido, ser compartilhado numa coligação com outros que obterão votações bem menores.
A insensatez se repete em 2014 e novamente esses partidos apresentarão candidaturas próprias para presidente e se espalharão num caleidoscópio surreal ao lado dos candidatos dos partidos burgueses. Será que as diferenças programáticas entre eles justificam esse distanciamento eleitoral? 
Entretanto, a miopia política desta vez é bem maior levando em consideração o que busquei discutir nas partes anteriores. Parece cômico, mas é trágico. Enquanto uma parcela cada vez maior da população brasileira dá as costas para as eleições, negando-se a fazer parte desse “teatro dos vampiros” – seja não indo votar, clicando no branco ou anulando o voto –, os que se dizem socialistas insistem em fazer figuração nesse processo, buscando a todo custo permanecerem como partidos reconhecidos oficialmente pelo Estado, locupletando-se, da mesma maneira que os outros, com dinheiro público.
O papel dos socialistas deve ser o de destruir as instituições burguesas, dentre elas o parlamento e as eleições, e não corroborar com esses pleitos alimentando as ilusões lançadas pela burguesia sobre os trabalhadores de que a solução para as suas mazelas só podem ser encontradas no processo eleitoral. Dirão os dirigentes desses partidos: “não geramos ilusões”. Então, proponho o seguinte exercício a todos que consigam permanecer acordados no horário eleitoral: observe qual dos partidos supracitados utilizará o seu parco tempo na mídia para defender que as eleições não passam de um mero jogo da burguesia, que elas não resolvem a vida dos trabalhadores, que aqueles que se negam a aceitar esse jogo e se recusam a votar não são meros tolos por igualarem todos os candidatos. Lamentavelmente, acho pouco provável que algum deles se digne a defender essas ideias.
De minha parte, estarei nas eleições 2014 ao lado daqueles que empunharão a bandeira do VOTO NULO, não porque todos os políticos sejam mais do mesmo, mas porque o sistema iguala todos que nele adentra. É possível que a campanha na mídia consiga alterar o grau de apatia eleitoral da população, mas não é isso o que as jornadas de junho do ano passado e o cotidiano dos que trabalham, das donas de casa, dos botequins etc. nos sugerem. Portanto, acredito que num momento como este em que uma parcela considerável dos trabalhadores brasileiros questiona as instituições burguesas e o sistema eleitoral, os socialistas têm a obrigação de contribuir para acelerar essa experiência.

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